Acordei meio muçulmano...
Era um domingo, umas 22h, Loic e eu estavamos numa brasserie devorando uma dessas saladas francesas que me fizeram deixar de lado o estereotipo de que salada é uma comida saudavel (tinha lardon, presunto cru, batata cozida, queijo derretido, hmmm...). O dia tinha sido cheio, estavamos morrendo de fome. Enfim, mais ou menos normal.
Entre uma garfada e outra, ele me diz:
- Queria tanto ser muçulmano. Acho que vou me converter ao islamismo.
Eu nao resistindo à piada:
- Otimo! Ai eu fico com o presunto da sua salada.
Ele continuou sério, pensativo.
- Queria ter toda essa fé, queria rezar cinco vezes no dia, fazer as ablaçoes, aprender o Corao...
- A gente tem o Corao em francês em casa, todo mundo lava a mao antes de comer (nao?!) e rezar cinco vezes ao dia ou ter fé é uma questao bem pessoal. Você nao precisa se converter ao islamismo por isso!
- Você nao quer que eu me converta? Tem preconceitos?
Religiao é um assunto sensivel, mais que futebol ou politica, porque mexe também com os sem-religiao - os sem-time e os sem-partido costumam sair ilesos dessas outras discussoes. Como me considero alguém bem resolvida no assunto, que nao tem mais conflitos internos sobre fé (depois de passar por varios!), acabo me achando no direito de palpitar sobre a religiosidade alheia.
Claro que nao vou interferir na religiao do meu cherido. Ao contrario, tudo o que eu quero é que ele seja feliz, bem resolvido. Mesmo que seja numa religiao tao distante da nossa cultura crista-ocidental, que prega habitos um tanto estranhos pra gente, como nao comer carne de porco, nao usar papel higiênico e mulheres de véu...
Ainda mais porque entendo bem o processo que o levou a ter essa ideia. Começa com uma profunda descrença na religiao de origem, no caso, o catolicismo. Tenho a impressao de que aqui na França existem ainda mais os que se auto-denominam "catolicos-de-batismo-nao-praticantes" que no Brasil, talvez por nao ter "concorrência" de outras igrejas cristas pentecostais nem influência da renovaçao carismatica e movimentos de base.
Tem ainda a questao social. Ser muçulmano na França é sinônimo de ser africano (negro ou magrebino) e, quase por consequência, vitima de exclusao social. Pra vocês terem uma ideia, ha uma rapper super famosa por aqui, a Diam's, que depois de muito cantar os problemas das periferias, se converteu ao islamismo - e passou a usar véu com todo um estilo rapper.
E, por fim, a questao pessoal. Eu mesma tenho certeza que so continuei catolica porque encontrei pessoas que me ajudaram a olhar com outros olhos essa igreja tao cheia de historia quando de problemas cabeludos. Com ele também é assim: varios amigos muçulmanos para mostrar que nao sao terroristas, extremistas ou machistas e que ha muita beleza e simbolismo em cada rito.
Num ponto a gente concorda: acreditamos em Deus (ou numa força superior que pode ter qualquer nome) e nao somos do tipo que pode ter uma religiao pra si, mas que quer fazer parte de uma historia ja ha muito pensada pela humanidade. Eu ja escolhi a minha. Ele ainda pensa na dele. E a gente vive muito bem juntos.
Entre uma garfada e outra, ele me diz:
- Queria tanto ser muçulmano. Acho que vou me converter ao islamismo.
Eu nao resistindo à piada:
- Otimo! Ai eu fico com o presunto da sua salada.
Ele continuou sério, pensativo.
- Queria ter toda essa fé, queria rezar cinco vezes no dia, fazer as ablaçoes, aprender o Corao...
- A gente tem o Corao em francês em casa, todo mundo lava a mao antes de comer (nao?!) e rezar cinco vezes ao dia ou ter fé é uma questao bem pessoal. Você nao precisa se converter ao islamismo por isso!
- Você nao quer que eu me converta? Tem preconceitos?
Religiao é um assunto sensivel, mais que futebol ou politica, porque mexe também com os sem-religiao - os sem-time e os sem-partido costumam sair ilesos dessas outras discussoes. Como me considero alguém bem resolvida no assunto, que nao tem mais conflitos internos sobre fé (depois de passar por varios!), acabo me achando no direito de palpitar sobre a religiosidade alheia.
Claro que nao vou interferir na religiao do meu cherido. Ao contrario, tudo o que eu quero é que ele seja feliz, bem resolvido. Mesmo que seja numa religiao tao distante da nossa cultura crista-ocidental, que prega habitos um tanto estranhos pra gente, como nao comer carne de porco, nao usar papel higiênico e mulheres de véu...
Ainda mais porque entendo bem o processo que o levou a ter essa ideia. Começa com uma profunda descrença na religiao de origem, no caso, o catolicismo. Tenho a impressao de que aqui na França existem ainda mais os que se auto-denominam "catolicos-de-batismo-nao-praticantes" que no Brasil, talvez por nao ter "concorrência" de outras igrejas cristas pentecostais nem influência da renovaçao carismatica e movimentos de base.
Tem ainda a questao social. Ser muçulmano na França é sinônimo de ser africano (negro ou magrebino) e, quase por consequência, vitima de exclusao social. Pra vocês terem uma ideia, ha uma rapper super famosa por aqui, a Diam's, que depois de muito cantar os problemas das periferias, se converteu ao islamismo - e passou a usar véu com todo um estilo rapper.
E, por fim, a questao pessoal. Eu mesma tenho certeza que so continuei catolica porque encontrei pessoas que me ajudaram a olhar com outros olhos essa igreja tao cheia de historia quando de problemas cabeludos. Com ele também é assim: varios amigos muçulmanos para mostrar que nao sao terroristas, extremistas ou machistas e que ha muita beleza e simbolismo em cada rito.
Num ponto a gente concorda: acreditamos em Deus (ou numa força superior que pode ter qualquer nome) e nao somos do tipo que pode ter uma religiao pra si, mas que quer fazer parte de uma historia ja ha muito pensada pela humanidade. Eu ja escolhi a minha. Ele ainda pensa na dele. E a gente vive muito bem juntos.