Contra empregadas domésticas

Publié le par alinemariane

Eu nunca vou ter uma empregada doméstica. Nem faxineira, diarista, baba, cozinheira, nada.

Revolta-me a situaçao das empregadas domésticas no Brasil. Sabia que a CLT nao é valida pra elas? Aos poucos, ganham mixarias de direitos, sempre acompanhados de compensaçoes para os patroes. Claro resquicio da relaçao senhor e escravo.

E la ainda tem essa: empregadas domésticas: mulheres, sempre. Os homens, se faxineiros, trabalham em empresas e sao (ou deveriam ser) CLT. Nem existe um masculino pra baba. Sao mulheres que, por uma situaçao de desigualdade social alarmante sao obrigadas a trabalhar com a relaçao menos direitos, mais trabalho. Em Sao Paulo, aberraçoes como "quarto e banheiro de empregada" ainda sao super comuns, para meu desespero.

Na casa dos meus pais, depois que nos mudamos para o interior de Sao Paulo, sempre tivemos empregada. Verdade que todas ficaram varios anos (três em 21 anos), eram gente boa, cuidaram bem de mim e tal. Mas depois que tomei um pouco mais de consciência, passei a ser completamente contra a ideia de empregar uma. Nos oito anos que morei com amigas em Sao Paulo, nos ultimos meses tive que a aceitar uma faxineira que minha roomate dizia "ter todos os registros num outro emprego". Confesso com muito contragosto ter pagado 60 reais para uma senhora limpar a minha casa - porque nao deixei lavar e passar minhas roupas - coisa que poderia muito bem fazer eu mesma.

Na França, na casa da unica familia que conheci que tinha empregados domésticos havia na verdade um faxineiro, sim, um homem de origem vietinamita que limpava toda a casa às segundas-feira. Nesse pais, ter uma "femme de menage" (outra vez a denominaçao feminina) é luxo apenas para os mais ricos, uma vez que é caro. Conheço varias brasileiras com alguma formaçao no Brasil que estao em Paris como femme de menage e estao bem contentes com seus salarios. Eu mesma fiz bicos como baba, coisa que nao valeria nada no Brasil.

Por aqui, em Dakar, a situaçao é ainda pior que no Brasil. Além de ser super comum, quase obrigatorio, que as familias tenham domésticas (sim, no plural), nao terem nenhum direito trabalhista (ok, esse é um problema nao apenas dessa categoria), ganharem incrivelmente pouco, elas ainda sao super mal tratadas.

Isso porque, como vocês podem imaginar, o Senegal tem uma cultura muito machista e as empregadas domésticas sao consideradas, ainda, como sub-mulheres. Nos escritorios, o comum é nem ter lixeira: joga-se tudo no chao para que a faxineira venha limpar. Ja presenciei coisas horriveis contra essas trabalhadoras: patroa que a acusa de roubar, que joga a comida que ela fez no chao porque nao estava bom, que da o pao velho e duro, enfim, humilhaçao mesmo - afinal, para que eu, que sou sempre visita diferente nas casas dos senegaleses, tenha visto de perto tudo isso, nao deve ser com outra intençao.

Por outro lado, as domésticas sempre comem com a familia, no mesmo prato (ou bacia). Claro que nao sem motivo: como comentei, é reservada às mulheres a tarefa de cortar e temperar ainda mais a carne / peixe durante a refeiçao e, na maior parte das vezes, a mulher que faz isso é a empregada.

Nesses dois meses, ja passaram três empregadas domésticas diferentes por aqui. Diferentemente da maioria das casas, ela chega pela manha, faz a limpeza, apenas lava, pica e arranja os ingredientes das refeiçoes e vai embora por volta das 14h. Ha uma segunda responsavel pela lavagem de roupas, que vem às segundas-feiras pega a roupa suja e volta às quartas com tudo lavado e passado. Minha amiga, a "dona da casa", também se diz incomodada com uma empregada em casa e com a situaçao dessas mulheres - ela estava comigo e também presenciou a cena da comida jogada no chao. Por isso a doméstica em tempo parcial.

A primeira era a unica que falava alguma coisa de francês. Estava gravida "de 10 meses", segundo ela, e depois de uma semana soubemos que o marido a enviou para um vilarejo para que o bebê nascesse la. A segunda nao falava francês, mas entendia quando eu falava com ela. Era super simpatica, guardava agua pra mim, queria ver minhas roupas e o que estava fazendo. Disse que iria para o casamento do irmao numa outra cidade e desapareceu. Quando minha amiga ja tinha "contratado" a terceira, ela reapareceu, arrumadissima, maquiada, com novo penteado, contando que ela também tinha se casado. A terceira além de nao falar francês, nao entende nada do que eu ou o Loic falamos. Nada, nadica, zero, nem "Bonjour, ça va?". Nao importa o que eu diga, às vezes estou em falando com alguém no Skype, ela abaixa a cabeça e diz "Waaw", "sim" em wolof.

Sinto-me a Sinha Aline. Nao, eu nunca vou ter uma empregada doméstica.

Publié dans em português

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M
Querida Aline, Adorei este teu texto e concordo com o principio que vc defende. Essa questão dos direitos trabalhistas e do machismo são mesmo revoltantes! Mas confesso que depois de ter tido a Sofia, o desespero doméstico bate de vez em quando. Enquanto era casada e sem filhos, nos trabalhavamos e dividiamos as tarefas domésticas. Conseguiamos fazer AQUELA faxina na casa uma vez por semana. Até tive durante um tempo (la no Brasil) uma faxineira que vinha uma vez por semana e aliviava horrores o nosso trabalho. Mas para nos era meio caro mantê-la e na verdade, a gente podia se virar sem a ajuda dela e foi o que fizemos. Aqui na França com a chegada da Sofia, tudo mudou de figura... isso que eu sou estudante, ou seja:o melhor emprego do mundo! E mesmo se a gente continua se dividindo entre cria, estudo e tarefas do lar, a gente raramente da conta do basico da semana. Levanto as mãos para o céu qdo consigo lavar toda a roupinha suja dela, estender, dobrar, guardar. Criança precisa e merece um ambiente limpo para explorar... e se a gentetem sobrevivido assim é um pouco às custas de uma rotina bem estressante... fico imaginando qdo a situação é agravada por varios filhos, trabalho oito horas por dia.Ao invés de chegar em casa e ficar um pouco com os filhos o que a cidadã faz? Vai lavar a roupa, lavar a louça, limpar o escritorio, sacudir o tapete, etc, etc... é a famosa tripla jornada... é por isso que tanta gente faz vista grossa para a realidade cruel dessas trabalhadoras... porque simplesmente não se vê dando conta do recado... como eu disse, bate o desespero doméstico...A situação ae, pelo que vc descreveu é ainda mais revoltante...e me faz entender melhor porque vc defende esse ponto de vista, que é,  no fim das contas o mais correto...Abraços!!!! 
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S
Eu quero vc de voltaaaaaaaaaaaa
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